Influenciado pelo socialista utópico Henri de Saint-Simon, trabalhou intensamente na criação de uma filosofia positiva como tentativa de remediar o mal-estar social da Revolução Francesa, criando uma doutrina social baseada nas ciências. Comte foi uma grande influência no pensamento do século XIX, influenciando o trabalho de intelectuais sociais como Karl Marx, John Stuart Mill e George Eliot. Seu conceito de sociologia e evolucionismo social deu o tom para os primeiros teóricos sociais e antropólogos, como Harriet Martineau e Herbert Spencer, evoluindo para a moderna sociologia acadêmica apresentada por Émile Durkheim como pesquisa social prática e objetiva.
As teorias sociais de Comte culminaram em sua "Religião da Humanidade", que pressagiava o desenvolvimento de organizações humanistas e humanistas religiosas não teístas no século XIX. Comte cunhou o significado da palavra altruísmo.[11] As ideias de Comte influenciaram as palavras Ordem e Progresso, lema presente na bandeira da República Federativa do Brasil.[12]
No período de 1817-1824 foi secretário do conde Henri de Saint-Simon, expoente do socialismo utópico. São dessa época algumas fórmulas fundamentais: "Tudo é relativo, eis o único princípio absoluto" (1819) e "Todas as concepções humanas passam por três estádios sucessivos - teológico, metafísico e positivo, com uma velocidade proporcional à velocidade dos fenômenos correspondentes" (1822) - "lei dos três estados". Rompeu com Saint-Simon ao discordar das ideias deste sobre as relações entre a ciência e a reorganização da sociedade. Comte estava convicto que o mestre priorizava auxílio à elite industrial e científica do período com sacrifício da reforma teórica do conhecimento.
Sofreu um colapso nervoso enquanto trabalhava na criação de uma filosofia positiva em 1826, supostamente desencadeado por "problemas conjugais". Recuperado, iniciou a redação de Curso de filosofia positiva (renomeado para Sistema de filosofia positiva em 1848), trabalho que lhe tomou 22 anos.[13]
Acabou perdendo o emprego de examinador de admissão à Escola Politécnica por criticar a corporação universitária francesa. Começou a ser ajudado por admiradores, como o pensador inglês John Stuart Mill (1806-1873). No mesmo ano separou-se de Caroline Massin, após 17 anos de casamento. Em 1845 apaixonou-se por Clotilde de Vaux, que morreria no ano seguinte por tuberculose.
Redigiu o Sistema de política positiva entre 1851 e 1854, no qual expôs algumas das principais consequências de sua concepção de mundo não teológica e não metafisica, propondo uma interpretação pura e plenamente humana para a sociedade e sugerindo soluções para os problemas sociais; no volume final da obra apresentou as instituições principais de sua Religião da Humanidade.
Publicou o primeiro volume de Síntese Subjetiva em 1856, projetada para abarcar quatro volumes, cada um a tratar de questões específicas das sociedades humanas: lógica, indústria, pedagogias e psicologias. Não pôde concluir a obra ao morrer, possivelmente de câncer, em 5 de setembro de 1857, em Paris. Sua última casa, na rua Monsieur-le-Prince, n. 10, foi posteriormente adquirida por positivistas e transformada no Museu Casa de Augusto Comte. Encontra-se sepultado no Cemitério do Père-Lachaise em Paris na França.[14]
A filosofia positiva de Comte nega que a explicação dos fenômenos naturais, assim como sociais, provenha de um só princípio. A visão positiva dos fatos abandona a consideração das causas dos fenômenos (Deus ou natureza) e pesquisa suas leis, vistas como relações abstratas e constantes entre fenômenos observáveis.
Adotando os critérios histórico e sistemático, outras ciências abstratas antes da Sociologia, segundo Comte, atingiram a positividade: a Matemática, a Astronomia, a Física, a Química e a Biologia. Assim como nessas ciências, em sua nova ciência inicialmente chamada de física social e posteriormente Sociologia, Comte usaria a observação, a experimentação, da comparação e a classificação como métodos - resumidas na filiação histórica - para a compreensão (isto é, para conhecimento) da realidade social. Comte afirmou que os fenômenos sociais podem e devem ser percebidos como os outros fenômenos da natureza, ou seja, como obedecendo as leis gerais; entretanto, sempre insistiu e argumentou que isso não equivale a reduzir os fenômenos sociais a outros fenômenos naturais (isso seria cometer o erro teórico e epistemológico do materialismo): a fundação da Sociologia implica que os fenômenos sociais são um tipo específico de realidade teórica e que devem ser explicados em termos sociais.
Em 1852, Comte instituiu uma sétima ciência, a Moral, cujo âmbito de pesquisa é a constituição psicológica do indivíduo e suas interações sociais.
Pode-se dizer que o conhecimento positivo busca "ver para prever, a fim de prover" - ou seja: conhecer a realidade para saber o que acontecerá a partir de nossas ações, para que o ser humano possa melhorar sua realidade. Dessa forma, a previsão científica caracteriza o pensamento positivo.
O espírito positivo, segundo Comte, tem a ciência como investigação do real. No social e no político, o espírito positivo passaria o poder espiritual para o controle dos "filósofos positivos", cujo poder é, nos termos comtianos, exclusivamente baseado nas opiniões e no aconselhamento, constituindo a sociedade civil e afastando-se a ação política prática desse poder espiritual - o que afasta o risco de tecnocracia (chamada, nos termos comtianos, de "pedantocracia").
O método positivo, em termos gerais, caracteriza-se pela observação. Entretanto, deve-se perceber que cada ciência, ou melhor, cada tipo de fenômeno tem suas particularidades, de modo que o método específico de observação para cada fenômeno será diferente. Além disso, a observação conjuga-se com a imaginação: ambas fazem parte da compreensão da realidade e são igualmente importantes, mas a relação entre ambas muda quando se passa da teologia para a positividade. Assim, para Comte, não é possível fazer ciência (ou arte, ou ações práticas, ou até mesmo amar!) sem a imaginação, isto é, sem uma ativa participação da subjetividade individual e por assim dizer coletiva: o importante é que essa subjetividade seja a todo instante confrontada com a realidade, isto é, com a objetividade.
Dessa forma, para Comte há um método geral para a ciência (observação subordinando a imaginação), mas não um método único para todas as ciências; além disso, a compreensão da realidade lida sempre com uma relação contínua entre o abstrato e o concreto, entre o objetivo e o subjetivo. As conclusões epistemológicas a que Comte chega, segundo ele, só são possíveis com o estudo da Humanidade como um todo, o que implica a fundação da Sociologia, que, para ele, é necessariamente histórica.
Além da realidade, outros princípios caracterizam o Positivismo: o relativismo, o espírito de conjunto (hoje em dia também chamado de "holismo") e a preocupação com o bem público (coletivo e individual). Na verdade, na obra "Apelo aos conservadores", Comte apresenta sete definições para o termo "positivo": real, útil, certo, preciso, relativo, orgânico e simpático.
"A gênese do Positivismo ocorreu no século XIX, num momento de transformações sociais e econômicas, políticas e ideológicas, tecnológicas e científicas profundas decorrentes da consolidação do capitalismo, enquanto modo de produção, através da propagação das atividades industriais na Europa e outras regiões do mundo. Portanto, o “século de Comte” e sua amada França mergulharam de corpo e alma numa “deusa” chamada razão, colocando sua fé numa “Nova Religião”, caracterizada pela junção entre a ciência e a tecnologia, tidas como a panaceia da humanidade, no contexto da expansão, pelo Globo, do Capitalismo Industrial." (VALENTIM 2010).
O alicerce fundamental da obra comtiana é, indiscutivelmente, a "Lei dos Três Estados", tendo como precursores nessa ideia seminal os pensadores Condorcet e, antes dele, Turgot.
Segundo o marquês de Condorcet, a humanidade avança de uma época bárbara e mística para outra civilizada e esclarecida, em melhoramentos contínuos e, em princípio, infindáveis - sendo essa marcha o que explicaria a marcha da história.
A partir da percepção do progresso humano, Comte formulou a Lei dos Três Estados. Observando a evolução das concepções intelectuais da humanidade, Comte percebeu que essa evolução passa por três estados teóricos diferentes: o estado 'teológico' ou 'fictício', o estado 'metafísico' ou 'abstrato' e o estado 'científico' ou 'positivo', em que:[15]
A fase teológica foi vista da perspectiva da França do século XIX como anterior à Era do Iluminismo, na qual o lugar do homem na sociedade e as restrições da sociedade ao homem eram referenciados a Deus. O homem acreditava cegamente em tudo o que lhe foi ensinado pelos seus antepassados. Ele acreditava em poder sobrenatural. O fetichismo desempenhou um papel significativo durante esse período.[15]
No estágio "Metafísico", Comte não se referiu à Metafísica de Aristóteles ou a outros filósofos gregos antigos. Em vez disso, a ideia estava enraizada nos problemas da sociedade francesa subsequente à Revolução Francesa de 1789. Esta fase metafísica envolveu a justificação dos direitos universais como estando num plano mais alardeado do que a autoridade de qualquer governante humano para contrariar, embora esses direitos fossem não se refere ao sagrado além da mera metáfora. Esta fase é conhecida como fase da investigação, porque as pessoas começaram a raciocinar e questionar, embora não tenham sido apresentadas provas sólidas. O palco da investigação foi o início de um mundo que questionava a autoridade e a religião.[15]
Na fase Científica, que surgiu após o fracasso da revolução e de Napoleão, as pessoas podiam encontrar soluções para os problemas sociais e colocá-las em vigor, apesar das proclamações dos direitos humanos ou da profecia da vontade de Deus. A ciência começou a responder perguntas a todo vapor. Nesse aspecto, ele era semelhante a Karl Marx e Jeremy Bentham. Por sua vez, esta ideia de um estágio científico foi considerada atualizada, embora, de um ponto de vista posterior, seja demasiado derivada da física clássica e da história acadêmica.[15]
É importante notar que cada um desses estágios representa fases necessárias da evolução humana, em que a forma de compreender a realidade conjuga-se com a estrutura social de cada sociedade e contribuindo para o desenvolvimento do ser humano e de cada sociedade.
Dessa forma, cada uma dessas fases tem suas abstrações, suas observações e sua imaginação; o que muda é a forma como cada um desses elementos conjuga-se com os demais. Da mesma forma, como cada um dos estágios é uma forma totalizante de compreender o ser humano e a realidade, cada uma delas consiste em uma forma de filosofar, isto é, todas elas engendram filosofias.
Como é possível perceber, há uma profunda discussão ao mesmo tempo sociológica, filosófica e epistemológica subjacente à lei dos três estados.
Os anseios de reforma intelectual e social de Comte desenvolveram-se por meio de sua Religião da Humanidade. Para Comte, "religião" e "teologia" não são termos sinônimos: a religião refere-se ao estado de unidade humana (psicológica, espiritual e social), enquanto a teologia refere-se à crença em entidades sobrenaturais. Considerando o caráter histórico e a necessidade de unidade do ser humano, a Religião da Humanidade incorpora nela a teologia e a metafísica - respeitando, reconhecendo e celebrando o papel histórico desempenhado por esses estágios provisórios, absorvendo o que eles têm de positivo (isto é, de real e de útil).
A Religião da Humanidade encontrou em Pierre Laffitte seu principal dirigente na França após a morte de Comte, especialmente na III Repúblicafrancesa. No Brasil, o Positivismo religioso encontrou grande aceitação no século XIX; embora com menor intensidade no século XX, o Positivismo religioso brasileiro teve grande importância: por exemplo, durante a campanha "O petróleo é nosso!", cujo vice-Presidente era o positivista Alfredo de Moraes Filho, e durante o processo de impeachment do ex-Presidente Fernando Collor de Mello, em que o Centro Positivista do Paraná também solicitou, assim como a Ordem dos Advogados do Brasil e Associação Brasileira de Imprensa, o afastamento do Presidente da República.
Volume 1 Les préliminaires généraux et la philosophie mathématique, 1830;
Volume 2 La Philosophie astronomique et la philosophie de la physique, 1835;
Volume 3 La Philosophie chimique et la philosophie biologique, 1838;
Volume 4 La Philosophie sociale et les conclusions générales, 1839;
Volume 5 La Partie historique de la philosophie sociale, 1841;
Volume 6 Le Complément de la philosophie sociale, et les conclusions générales, 1842;
Traité élémentaire de géométrie analytique à deux et à trois dimensions, contenant toutes les théories générales de géométrie accessibles à l'analyse ordinaire, Paris, Carilian-Gœury e V. Dalmont, 1843;
Traité philosophique d'astronomie populaire, Paris, Carilian-Gœury e V. Dalmont, 1844;
Discours sur l'esprit positif, Paris, Carilian-Gœury e V. Dalmont, février 1844;
Discours sur l'ensemble du positivisme ou Exposition sommaire de la doctrine philosophique et sociale propre à la grande république occidentale, Paris, Librairie scientifique-industrielle L. Mathias e chez Carilian-Gœury e V. Dalmont, 1848;
Système de politique positive ou Traité de sociologie instituant la religion de l'Humanité, edição original em quatro tomos, 1851-1854, Paris, Carilian-Gœury e V. Dalmont,
Volume 1 contenant le Discours préliminaire, et l'Introduction fondamentale, juillet 1851;
Volume 2 contenant la Statique sociale ou le Traité abstrait de l'être humain, mai 1852;
Volume 3 contenant la Dynamique sociale ou le Traité général du progrès humain, 1853;
Volume 4 et dernier contenant le Tableau synthétique de l'esprit humain, août 1854;
Catéchisme positiviste, Paris, Carilian-Gœury e V. Dalmont, out. 1852;
Appel aux conservateurs, Paris, V. Dalmont, nov. 1856;
Synthèse subjective ou système universel, Paris, V. Dalmont, nov. 1856;
Sommaire appréciation du passé moderne, apresentação e notas de Angèle Kremer-Marietti, Paris, Aubier, 1971;
Prospectus des travaux scientifiques nécessaires pour réorganiser la société, apresentação e notas de Angèle Kremer-Marietti, Paris, L'Harmattan, 2001;
Plan des travaux scientifiques nécessaires pour réorganiser la société, apresentação e notas de Angèle Kremer-Marietti, Paris, Aubier, 1970;
Cours de philosophie positive I, apresentação e notas de Michel Serres, Alla Sinaceur e François Dagognet, Paris, Hermann, 1998;
Physique sociale. Cours de philosophie positive, leçons 46 à 60, apresentação e notas de Jean-Paul Enthoven, Paris, Hermann, 1975;
Auguste Comte: Écrits de jeunesse 1816-1828, publ. por Paulo E. de Berrêdo Carneiro e Pierre Arnaud, Paris, Mouton, 1970;
Auguste Comte/ Caroline Massin. Correspondance inédite (1831-1851), texto estabelecido por Pascaline Gentil, notas de Bruno Gentil, introdução de Mary Pickering, Paris, L'Harmattan, 2006;
Correspondance de John Stuart Mill et d'Auguste Comte, publicado por Lucien Lévy-Bruhl, L'Harmattan, 2007.
↑"(...) the only thing we have in common with those so designated is that we do not believe in God." John Stuart Mill, Auguste Comte. 'The Correspondence of John Stuart Mill and Auguste Comte', Transaction Publishers, p. 320.
↑"Despite his atheism, Comte was concerned with moral regeneration and the establishment of a spiritual power." Mary Pickering, 'Auguste Comte and the Saint-Simonians', French Historical Studies Vol. 18, No. 1 (Spring 1993), pp. 211-236.
↑"But tragically, Comte's "remarkable clearness and extent of vision as to natural things" was coupled with a "total blindness in regard to all that pertains to man's spiritual nature and relations." His "astonishing philosophic power" served only to increase the "plausibility" of a dangerous infidelity. Comte was, once unmasked, a "blank, avowed, unblushing Atheist." [...] Some of the Reformed writers were careful enough to note that technically Comte was not an atheist since he never denied the existence of God, merely his comprehensibility. Practically, however, this made little difference. It only pointed to the skepticism and nescience at the core of his positivism. The epistemological issues dominated the criticism of Comte. Quickly, his atheism was traced to his sensual psychology (or "sensualistic psychology", as Robert Dabney preferred to say)." Charles D. Cashdollar, 'Auguste Comte and the American Reformed Theologians', Journal of the History of Ideas Vol. 39, No. 1 (January–March 1978), pp. 61-79.
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