Jurema (árvore)
A jurema é uma planta da família das leguminosas, comum no Nordeste brasileiro, algumas com efeitos psicoativos. A família das leguminosas possui importantes espécies cultivadas para alimentação, inclusive do nordestino (mangalô, andu, algaroba, além de feijões de diversas espécies incluindo a soja). A subfamília Faboidea ou Fabaceae também exerce importante função ecológica por abrigar espécies de bactérias nitrificantes ou seja que fixam nitrogênio, essencial para a vida no solo.[1] O termo jurema designa várias espécies de Leguminosas dos gêneros Mimosa, Acacia e Pithecellobium.[2][3] No gênero Mimosa, cita-se a Mimosa verrucosa Benth e a Mimosa tenuiflora Willd (ainda comumente chamada de Mimosa hostilis Benth, ou, outrora, Mimosa Nigra ou Acacia jurema Mart, ou Acacia hostilis Mart.). No gênero Acacia identifica-se a Acacia piauhyensis Benth. Além disso várias espécies do gênero Pithecellobium também são designadas por esse mesmo nome. A classificação popular distingue a jurema branca e jurema preta. Para Sangirardi Jr.(o.c.) a jurema preta é a M. hostilis ou M. nigra, a Jurema branca o Pithecellobium diversifolium Benth e a Mimosa verucosa corresponde a jurema-de-oeiras. Ainda segundo esse autor o termo jurema, jerema ou gerema vem do tupi yú-r-ema – espinheiro. Entre espécies conhecidas como jurema inclui-se ainda jurema-embira (Mimosa ophthalmocentra) e jurema-angico (Acacia cebil), entre outras. Lima refere-se a existência de juremas pretas aculeadas e inermes. Das espécies colhidas por ele em Arcoverde (PE), concluiu após análise de renomados botânicos, que ambas podem ser classificadas como Mimosa hostilis Benth ou Acacia hostilis Mart. Reise I e que são possuidoras do mesmo alcaloide.[4] Souza et al.[5] em estudos de revisão identificou dezenove espécies diferentes conhecidas como "Jurema" onde se constata a presença de alcalóides, embora, segundo seu estudo as espécies conhecidas sobretudo como como "jurema-branca" não contenham alcalóides triptaminicos. Além da Jurema a família das Leguminosas também abriga entre quatro e cinco espécies com compostos psicoativos em sua composição bioquímica, a saber: Erythrina crista-galli, o mulungu ou corticeira, conhecido sedativo;[6] Mimosa pudica, com propriedades anti-reumáticas, sedativas e laxantes;[7] Piptadenia peregrina, da qual se faz o rapé paricá com propriedades psicoativas utilizado por índios da Amazônia em rituais. (Sangirardi Jr.1983 (o.c.)) Algumas variedades de acácias australianas como a Acacia maidenii também possuem propriedades semelhantes à Jurema.[8][9] Composição fitoquímicaJá foi identificado nas cascas e raízes frescas da jurema (Mimosa hostilis): um alcaloide denominado por nigerina em 1949 (Lima, Gonçalves O, apud Sangirard Jr.,o.c.) identificado posteriormente como um alcaloide indólico a N,N-dimetiltriptamina – DMT uma potente substância alucinógena ou psicodisléptica responsável pelo seu efeito.[10][11][5] As acacias são encontradas amplamente distribuídas pelo globo, por exemplo no México, Austrália, África e Oriente, sendo que muitas delas são psicoativas, assim como sagradas em várias culturas[12] Na utilização como substancia psicoativa extraída do grupo de vegetais que possuem DMT – o núcleo indol e derivados da triptamina, como a Jurema (Mimosa) e a Psychotria nas rubiáceas, é logicamente possível a combinação destes com plantas que contenham inibidores da sua degradação metabólica, tipo os derivados do harmano / harmina, tal como foi identificada na Ayahuasca da América do Sul combinando-se a Chacrona (Psychotria viridis) com o Mariri (Banisteria caapi).[13] Identifica-se também a harmina no Maracujá (Passiflora) e na arruda síria (Peganum harmala), usados tradicionalmente de modo independente.[14][15] Há quem afirme que alguma variedade de maracujá já foi utilizada em combinação com a jurema e mais recentemente combinou-se em rituais do Xucuru-kiriri jurema (Mimosa hostilis) com Peganum harmala.[16] O Maracujá, Passiflora incarnata, P. alata P. edulis e outras variedades, há milênios é utilizado na América. Popularmente reconhecido com auxiliar para minimizar os efeitos provocados pelos processos de depressão, desequilíbrio do sistema nervoso, insônia, inquietação, fadiga, e espasmos musculares. Extratos do P. edulis e Incarnata já foram experimentos com efeitos positivos no prolongamento do efeito do sono com pentobarbital, ação analgésica e bloqueadora de estimulação por adrenalina.[17][18] No uso da jurema no nordeste do Brasil há referências de uso a diversas combinações (misturas) e modos de uso e preparação. Entrecascas e raízes da Jurema (Mimosa) extraídas com álcool, com água (por decocção ou maceração) com e sem fermentação.[19] Registra-se também na literatura a combinação com o Manacá (Brunfelsia uniflora Don)– Essa combinação parece ser a mais perigosa, tudo indica que foi utilizada na Manifestação Sebastianista (Pe) que resultou em psicose coletiva (Sangirardi Jr, o.c.). O elemento ativo do Manacá é de natureza psicoativa, anestésica, analgésica[20] e possivelmente simpaticolítica – atropínico ou anticolinérgico.[21] Combinada com Peganum harmala (Syrian rue) – Xucuru xocó (Pe) tem efeito semelhante a combinação com maracujá, pois ambas as plantas, como vimos possuem substancias semelhantes. A combinação com maracujá silvestre ou maracujá do mato, foi sugerida como o “segredo perdido” [22] contudo a família do maracujá (Passifloraceae) possui 16 gêneros, com cerca de 600 espécies espalhadas por todo o mundo. Nesse sentido o segredo da Jurema não é a sua atividade oral, mas a capacidade de ser absorvido, produzindo efeito no sistema nervoso central. O vinho de jurema dos catimbó e umbandas também possuem receitas secretas algumas com álcool (vinho branco cachaça), mel, sangue de aves,[23] Alecrim e Alho (Grünewald o.c.) Entre as formas de consumo na medicina indígena está a utilização simultânea com fumo (Nicotiana tabacum), realizada por todas as tribos no Nordeste; com Cannabis sativa, (Swelinho Seda) possivelmente realizada por Fulniôs – PE;[24] com Poncho de Maracujá (Atikun - Pe) (Ott, Jonathan, 1997/98 o.c.) e com Cachaça em algumas tribos no Nordeste (Sangirardi Jr o.c.).[25] Quanto a utilização simultânea como o fumo, deve-se considerar que os níveis das enzimas monoamina oxidase A (MAO-A) e MAO-B estão reduzidos nas plaquetas e no cérebro dos fumantes e que outras substâncias, além da nicotina, presentes na fumaça do tabaco têm atividades inibidoras da MAO. [26] [27] [28] EfeitoO vinho de Jurema, preparado à base de variedades de jurema, principalmente a jurema-preta Mimosa hostilis, a jurema-embira ou vermelha (Mimosa ophthalmocentra) e a Jurema-branca (Mimosa verrucosa), é usado pelos remanescentes índios e caboclos do Brasil. Além de conhecido pelo interior do Brasil na farmacopéia popular como cicatrizante, tratamento de infecções é também utilizado nas cidades em rituais de Candomblé, combinado com diferentes ervas, com diversas formas de preparo (mantidas como segredo).[5] Os efeitos do vinho de jurema são muito bem descritos por José de Alencar no romance Iracema. Para entender seu efeito psicoativo não basta analisar a composição molecular e comparar com as denominadas drogas alucinógenas, é necessário situar-se no contexto de expectativas e formas de uso da substancia nos sistemas de crenças brasileiros. Deve-se considerar o processo de aculturação, assimilação resultante dos ´"aldeamentos" indígena da missões colonizadoras bem como o retorno à identidade étnica, períodos quando não se registrou o hábito de beber a jurema e momentos em que os torés foram resgatados ou criados entre os grupos indígenas do Nordeste. Nos referidos grupos tanto a bebida da jurema voltou a se fazer presente, como permanece apenas sendo citada em suas canções, invocações, enquanto símbolo - alicerce de sua autoctonia.[29] Apesar de parecer óbvia a suposição de que se drogas psicotrópicas afetam o sistema nervoso central do homem de modo semelhante a estas deve ser associado um número finito de símbolos, a diversidade cultural e individualidade humana é sempre surpreendente. Assim tem procedido os especialistas em tal classe de psicotrópicos, promovendo o conhecimento do maior número possível de ritos e descrições individuais.[30] Observe-se inclusive que por esse método de pesquisa já se denomina essas substancias como enteógenos opondo-se a classificação como alucinógeno ou psicotomimético com as descrições de estados oníricos, das psicoses em vez de êxtase religioso e possessão divina como o nome enteógeno refere. A persistência do uso da jurema em rituais indígenas e religiões populares do Nordeste do Brasil (Catimbó), apesar de combatida pela colonização católica, com os rigores da inquisição[31] e da polícia, por si só indica sua importância farmacêutica e simbólica para grupos que possuem uma forma específica de organização social entre a sociedade tribal e as comunidades religiosas. Contudo pode-se atribuir a essa perseguição a diversidade no modo de uso e mesmo as dificuldades da identificação da espécie.[32] Os índios do Nordeste apesar do processo de integração à sociedade nacional conservaram em algumas regiões organizações que sobrevivem como grupos religiosos e entidades civis tuteladas pelo estado identificadas em etnias sobreviventes e Missões indígenas. Pelo menos 5 etnias ainda utilizam a Jurema em seus rituais: Kiriris, Tuxás, Pankararé no Nordeste; Tupinambás de Olivença – Sul da Bahia; Atikun, Kariú Kariri no Maranhão, Fulniôs, Xucuru-kiriri em Pernambuco e Kariris em Alagoas e os Xocós de Sergipe.[33][34][35][36] Ver também
Referências
Ligações externas
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