É representada em típico estilo pré-rafaelita a deusa grega e romana Proserpina que foi castigada a viver no submundo durante o inverno. Nas mitologias grega e romana, Proserpina era filha de Ceres e foi levada para o submundo (Hades) por Plutão, que se casou com ela apesar dela estar enamorada por Adónis. Quando Ceres lhe pediu para a filha voltar para a Terra, Júpiter concordou na condição de Proserpina não comer nenhuma fruta do Hades. Mas como comeu seis grãos de romã, como castigo Proserpina foi obrigada a permanecer seis meses (inverno) por ano no Hades, podendo voltar ao mundo superior nos outros seis meses (verão).[1]
Proserpina, tal como a modelo Jane Morris, é uma mulher bela e requintada, com traços do rosto delicados, mãos finas e pele perfeitamente clara, adornada pelo cabelo negro espesso. Rossetti pintou-a num momento em que a sua saúde mental era muito precária e a sua paixão por Jane Morris estava no momento mais obsessivo.[2]
Descrição
Rossetti escreveu acerca de Proserpina
Está representada num corredor sombrio do seu palácio, com o fruto fatal na sua mão. Quando está a passar, uma luz de alguma fresta que se abriu de repente projeta-se na parede atrás dela, permitindo por um momento o vislumbre do mundo superior; e ela olha furtivamente para lá, imersa em pensamentos. O queimador de incenso está ao lado dela como o atributo de uma deusa. O ramo de hera no fundo pode ser tomado como um símbolo das memórias que perduram.[3]
Incapaz de se decidir pela pintura ou pela poesia, a obra de Rossetti está impregnada da sua imaginação poética e pela interpretação pessoal das fontes literárias. O seu soneto que acompanha esta obra é um poema de saudade: "Longe de mim me sinto; e sempre sonhando" (ver o soneto a seguir), sendo uma alusão incontornável ao seu anseio de seduzir Jane justicando-se com o casamento infeliz dela com William Morris. Proserpina tinha sido presa no reino subterrâneo de Plutão por ter provado o fruto proibidoː a romã. Jane, presa pela convenção (contrato nupcial), está também a degustar o fruto proibido.[4] Há um outro significado subjacente na pintura, pois Rossetti esteve durante anos com Jane em Kelmscott Manor nos meses de verão, voltando ela para o marido William Morris no inverno, fazendo assim o paralelismo com a liberdade de Proserpina no verão.
O simbolismo nesta pintura de Rossetti indica incisivamente a situação de Proserpina, tal como a de Jane Morris, dividida esta entre o marido e pai das suas duas filhas adoradas, e o seu amante. A romã atrai a atenção, combinando a cor dos seus grãos com a dos lábios carnudos de Proserpina. A hera atrás dela, como Rossetti afirma, representa a memória que não despega e a passagem do tempo; a sombra na parede é a estada no Hades, e o reflexo da luz solar, o vislumbre da terra. O vestido, como água derramada, sugere o vaivém das marés, e o queimador de incenso representa a imortalidade do tema. Os olhos tristes de Proserpina, que são do mesmo azul frio da maior parte da pintura, olham indiretamente para o "outro" mundo. No geral, os tons escuros dominam o conjunto cromático da obra.[5]
Embora tenha inserido a data de 1874 na pintura, Rossetti trabalhou durante sete anos em oito telas diferentes antes de terminar a obra. A pintura está assinada e datada num hipotético rolo de pergaminho no canto inferior esquerdo: 'DANTE GABRIELE ROSSETTI RITRASSE NEL CAPODANNO DEL 1874' (em italiano) (Dante Gabriel Rossetti pintou no início de 1874). A moldura, desenhada por Rossetti, tem medalhões que se assemelham a uma seção de romã, refletindo a que Proserpina tem na mão.
O soneto inserido
No canto superior direito de Proserpina foi inserido pelo artista um soneto seu em italiano.[7] O mesmo soneto em inglês está inscrito na moldura:[1]
Rossetti começou a trabalhar nesta obra em 1871 e pintou pelo menos oito versões diferentes, a última completada apenas em 1882, o ano da sua morte, tendo as primeiras versões sido encomendadas por Charles A. Howell. A pintura objecto deste artigo é a chamada sétima versão e foi encomendada por Frederick Richards Leyland, que está agora na Tate Gallery, estando a última versão, muito semelhante à da Tate, no Birmingham Museum and Art Gallery.[10][11][12]
Leyland encomendou a Rossetti dezoito pinturas, sem contar com as encomendas não satisfeitas. Logo após a entrega da pintura, Leyland e Rossetti pensaram na hipótese de um tríptico de Rossetti, que acabou por ser formado com Mnemosine, The Blessed Damozel e Proserpine.[13] Três outras pinturas de Rossetti foram colocadas no salão da residência de Leyland (imagem abaixo) às quais este apelidava de "encantadoras."[9]
Referências
↑ abRiggs, Terry (1998). «Proserpine 1874». Tate Collection. Consultado em 3 de Junho de 2016
↑V. Surtees, Dante Gabriel Rossetti 1828–1882. The Paintings and Drawings, Clarendon Press (1971), I, pp.131–4
↑W. E. Fredeman (ed.), The correspondence of Dante Gabriel Rossetti, 7 Vols., Brewer (2002–8).
↑McGann, Jerome (editor) (2005). «Proserpine, 1872». Rossetti Archive. Institute for Advanced Technology in the Humanities, University of Virginia. Consultado em 3 de Junho de 2016
↑McGann, Jerome (editor) (2005). «Proserpine (oil replica, eighth version), 1882». Rossetti Archive. Institute for Advanced Technology in the Humanities, University of Virginia. Consultado em 3 de Junho de 2016
Wildman, Stephen; Laurel Bradley; Deborah Cherry; John Christian; David B. Elliott; Betty Elzea; Margaretta Fredrick; Caroline Hannah; Jan Marsh; Gayle Seymour (2004). Waking Dreams, the Art of the Pre-Raphaelites from the Delaware Art Museum. [S.l.]: Art Services International. 395 páginas
Bibliografia
Ash, Russell. (1995) Dante Gabriel Rossetti. London: Pavilion Books.
Doughty, Oswald (1949) A Victorian Romantic: Dante Gabriel Rossetti London: Frederick Muller.
Fredeman, William E. (ed.) (2002–08) The correspondence of Dante Gabriel Rossetti. 7 Vols., Brewer, Cambridge.
Hilto, Timoth (1970). The Pre-Raphelites. London: Thames and Hudson, New York: Abrams.