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Áudios do Superior Tribunal Militar

Os áudios do Superior Tribunal Militar referem-se a um conjunto de cerca de 10 mil horas de gravações das sessões do referido tribunal brasileiro, abarcando os anos de 1975 e 1985, período no qual o Brasil vivia uma ditadura militar.[1][2]

História

Em 2006, o advogado Fernando Augusto Fernandes solicitou acesso ao material, mas à época o Superior Tribunal Militar (STM) se recusou a atendê-lo.[1] Ele acionou então o Supremo Tribunal Federal (STF) e no ano de 2011 a ministra Cármen Lúcia ordenou que o material fosse disponibilizado.[1] Contudo, a ordem foi cumprida apenas quando o Plenário do STF acompanhou o voto da ministra.[1] A revelação pública dos áudios foi feita em abril de 2022 pela jornalista Miriam Leitão, do jornal O Globo.[1] Os trechos dos áudios expõem que os ministros do STM recebiam denúncias e tinham ciência da violência policial na época.[3] [4] De acordo com Fernando Augusto Fernandes, os áudios também trazem julgamentos de militares por corrupção, desbancando o mito de que a prática não ocorria durante a Ditadura Militar.[5] O historiador da Universidade Federal do Rio de Janeiro Carlos Fico explicou durante uma entrevista que tem analisado os áudios desde 2018, mas decidiu entregá-los a Miriam Leitão após o deputado federal Eduardo Bolsonaro duvidar das torturas praticadas contra ela no período da ditadura militar.[3] O deputado chegou a ironizar uma das torturas sofridas pela jornalista, compartilhando uma imagem de um texto publicado por Leitão em sua coluna e escrevendo em seguida: "Ainda com pena da [emoji de cobra]".[4] Míriam Leitão foi presa e torturada enquanto estava grávida e, durante as sessões de tortura, foi deixada nua numa sala escura com uma cobra.

Em 2023, Fernando Fernandes acionou o STF, em processo contra o STM movido pela ministra Cármen Lúcia, afirmando que as fitas da defesa de Idibal Matto Pivetta de 16 de setembro de 1975 haviam sumido. O STM afirmou que muitos dos áudios de época estavam com baixa qualidade devido ao estado original das fitas, mas que ainda as mantinham guardadas.[6][7]

Registros

Voz Data Apelação Áudios[1][2][8]
Ministro Amarílio Lopes Salgado 15 de junho de 1976 41.027 Uma pessoa delatou na procuradoria geral dois homens que o torturaram sob acusação de assaltar dois bancos, mesmo que estivesse preso na ocasião. Ele recebeu marteladas para confessar o crime.
Em análise do historiador Carlos Fico, o almirante Sampaio Ferraz 16 de junho de 1976 41.027 Sampaio diz ser revisor de um caso de tortura e diz que o inquérito policial não tem valor pois casos do tipo acontecem muito dentro do DOPS.
Ministro Waldemar Torres da Costa 13 de outubro de 1976 41.229 Waldemar Torres da Costa admite que o caso de tortura de Dalton Godinho parece vero por conta dos detalhes descritos pela acusação.
Almirante Júlio de Sá Bierrenbach 19 de outubro de 1976 41.264 O almirante admite que houve tortura, mas argumenta que não era generalizada. Ele diz que a tortura era empregada por "certos setores policiais."
Ministros Rodrigo Octávio e Augusto Fragoso 15 de dezembro de 1976 Os ministros falam sobre um parecer de Djalma Marinho. O General Rodrigo Octávio defende a cassação de Djalma por fora da lei por motivos de segurança, ato que o mesmo chamou de revolucionário. Augusto Fragoso diz que a condenação será dentro da justiça se houver controvérsia no caso. Como argumento, o ministro cita a mensagem do presidente Costa e Silva respondendo a carta do Daniel Krieger e que cita os argumentos dele, baseado no parecer do ministro Gama e Silva.
General Rodrigo Octávio 24 de junho de 1977 41.048
Brigadeiro Deoclécio Lima de Siqueira 19 de outubro de 1977 O relator diz que o STM não deveria receber casos de tortura indiscriminadamente para evitar o compromentimento daqueles que se contrapõe à subversão.
Brigadeiro Faber Cintra 15 de fevereiro de 1978 41.648 Cintra argumenta que as acusações de tortura contra o coronel Iris Lustosa devem ser apuradas desde que procedentes, já que os torturados estariam fazendo muitas alegações sem provas. Todos afirmam terem estado em cárcere por pelo menos 30 dias, sem saber o local por terem sido encapuzados na ocasião da prisão.
  • Francisco Carcará e Orlando Magalhães foram presos na Vila Militar, onde foram bem tratados. Francisco ficou preso por 40 dias e foi torturado. Alega não ter feito o exame de corpo de delito por estar incomunicável.
  • Ana Maria Mandim foi torturada na Vila Militar, mas pode ver seu pai 10 dias após ser presa.
  • Sérgio Simões prestou depoimento na Vila Militar e sofreu agressões.
  • Newton Medeiros foi preso em lugar desconhecido e posteriormente transferido para a Vila Militar.
  • Antonio Alberto Souza ficou preso por 55 dias, que não coincide com as datas de prisão e soltura.
  • Antonio Viana Sad saiu da prisão com o nariz sangrando, problema que perdura até a data da apelação.
  • Antonio Forges esteve preso por 40 dias em local desconhecido.
  • Romeiro Passos ficou 8 dias sem comer.
  • Antonio Botelho afirmou que seu advogado provará suas acusações.
General Augusto Fragoso 9 de junho de 1978 41.593 General Augusto Fragoso admite que pelo menos parte dos rumores de tortura vindos do DOI-CODI parecem reais.
Advogado Sobral Pinto 20 de junho de 1979 41.301 O jornalista Marco Antonio Tavares Coelho teve a tortura confirmada por um laudo feito por médicos militares.

Repercussão

O presidente da Comissão de Direitos Humanos, senador Humberto Costa (PT-PE), disse que pedirá acesso aos áudios, e que a Comissão Nacional da Verdade deu um grande passo, muito embora ainda haja muito trabalho a ser feito sobre o período histórico.[9] As forças armadas reagiram com indiferença, argumentando que na época o Brasil vivia um conflito e ambos os lados cometeram excessos.[10] O vice-presidente Hamilton Mourão riu quando perguntado sobre a possibilidade de investigação das torturas, dizendo que os envolvidos já estão mortos.[11] Em resposta, Miriam Leitão ressaltou que a investigação é importante justamente por causa do deboche que é feito sobre os casos de tortura durante a ditadura.[12] Carlos Fico respondeu que Mourão é um "homem de poucas luzes".[13] O âncora da Rádio BandNews FM, Reinaldo Azevedo, disse estar chocado com os áudios, que reforçam as atrocidades cometidas durante a Ditadura Militar.[14] O ex-ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência do Brasil Carlos Alberto dos Santos Cruz afirmou que a tortura é imoral e não deve ser aceita e nem feita apologia. "Tem gente que nem é militar e faz apologia como se fossem coisas heroicas. Você vê pessoas que nasceram 30 anos depois da ditadura apoiando as práticas. Deputados se envolvem com isso porque não têm condição de discutir coisas válidas".[15] A ministra do STM, Maria Elizabeth Rocha, disse que a divulgação dos áudios é importante para que ”erros que foram cometidos não se repitam”[16] No dia 19 de abril, durante a celebração do Dia do Exército, o então presidente do STM, general Luis Carlos Gomes Mattos, disse que a revelação dos áudios não havia estragado sua Páscoa e a de mais ninguém. Mattos declarou:[17]

Ver também

Referências

  1. a b c d e f «Áudios do Superior Tribunal Militar provam prática de tortura na ditadura». Consultor Jurídico. Consultado em 20 de abril de 2022 
  2. a b Ministros militares falam sobre tortura: 'eles apanham mesmo' no YouTube. O Globo, 17 de abril de 2021.
  3. a b «Áudios do STM na ditadura têm confissão sob marteladas e aborto após choque». noticias.uol.com.br. Consultado em 20 de abril de 2022 
  4. a b «Eduardo Bolsonaro ironiza tortura sofrida pela jornalista Míriam Leitão». Folha de S.Paulo. 3 de abril de 2022. Consultado em 20 de abril de 2022 
  5. Rafaella Barros (23 de abril de 2022). «Áudios revelam corrupção no regime militar, diz advogado». Poder360. Consultado em 17 de agosto de 2022. Cópia arquivada em 18 de agosto de 2022 
  6. Mônica Bergamo (27 de janeiro de 2023). «Justiça Militar é acionada no STF por supostamente omitir áudios da ditadura». Folha de S.Paulo. Consultado em 3 de janeiro de 2024. Cópia arquivada em 3 de janeiro de 2024 
  7. Mônica Bergamo (2 de janeiro de 2024). «Justiça Militar será acionada no STF após gravação de Idibal Pivetta na ditadura não ser encontrada». Folha de S.Paulo. Consultado em 3 de janeiro de 2024. Cópia arquivada em 3 de janeiro de 2024 
  8. «Leia a íntegra dos áudios sobre tortura na ditadura militar». Poder360. 17 de abril de 2022. Consultado em 20 de abril de 2022. Cópia arquivada em 20 de abril de 2022 
  9. «Comissão do Senado pedirá acesso a áudios de ministros do STM sobre tortura». Uol. 18 de abril de 2022. Consultado em 20 de abril de 2022. Cópia arquivada em 20 de abril de 2022 
  10. Ana Lesnovski, Álvaro Borba (19 de abril de 2022). «Forças Armadas Ignoram Escândalos em Série». Meteoro Brasil. Consultado em 20 de abril de 2022 
  11. «Mourão ri sobre investigação de tortura na ditadura: 'Os caras já morreram'». UOL Notícias. Consultado em 9 de maio de 2022 
  12. «Mirian Leitão rebate Mourão após ironia sobre áudios que revelam tortura». Uol. 18 de abril de 2022. Consultado em 20 de abril de 2022. Cópia arquivada em 20 de abril de 2022 
  13. «Mourão é 'homem de poucas luzes', diz historiador que analisa áudios do STM». UOL Política. 18 de abril de 2022. Consultado em 18 de abril de 2022. Cópia arquivada em 18 de abril de 2022 
  14. «Reinaldo: A tortura que a canalha tenta esconder». Rádio BandNews FM. 18 de abril de 2022. Consultado em 3 de setembro de 2022. Cópia arquivada em 3 de setembro de 2022 
  15. «Santos Cruz: Tortura na ditadura é imoral; não pode ser praticada e apoiada». Uol. 19 de abril de 2022. Consultado em 7 de setembro de 2022. Cópia arquivada em 7 de setembro de 2022 
  16. Andréia Sadi (18 de abril de 2022). «Áudios de tortura na ditadura: divulgação é importante 'para que erros não se repitam', diz ministra do Superior Tribunal Militar». G1. Consultado em 2 de setembro de 2022. Cópia arquivada em 2 de setembro de 2022 
  17. «Presidente do STM sobre áudios da ditadura: "garanto que não estragou a Páscoa de ninguém"». CNN Brasil. Consultado em 20 de abril de 2022 
  18. «Presidente do Superior Tribunal Militar ironiza áudios sobre tortura: 'Não estragaram a minha Páscoa' - CartaCapital». www.cartacapital.com.br. Consultado em 20 de abril de 2022 
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