A Geração de 98 (Generación del 98 em espanhol) é a denominação atribuída a um grupo de escritores, ensaístas e poetas espanhóis que se viram profundamente afetados pela crise moral, política e social na Espanha subsequente à derrota militar na Guerra Hispano-Americana e a consequente perda de Porto Rico, Cuba e Filipinas em 1898. Todos os autores englobados nessa geração nasceram entre 1864 e 1875.
Inspiraram-se na corrente crítica do canovismo denominada regeneracionismo e ofereceram uma visão artística em conjunto em La generación del 98. Clásicos y modernos.
Estes autores começaram a escrever numa veia juvenil hipercrítica e esquerdista que mais tarde se orientaria para uma concepção tradicional do velho e do novo. Pronto, porém, seguiu a polêmica: Pío Baroja e Ramiro de Maeztu negaram a existência de tal geração, e tarde Pedro Salinas afirmou-a, após uma minuciosa análise, nos seus cursos universitários e num breve artigo aparecido em Revista de Occidente (Dezembro de 1935), seguindo o conceito de "geração literária" definido por Peterson; este artigo apareceu depois na sua obra Literatura española. Siglo XX, 1949.
A maioria dos textos escritos durante esta época literária foram produzidos nos anos imediatamente posteriores a 1910 e são sempre pontuados pela auto-justificação dos radicalismos e rebeldias juvenis (Machado nos últimos poemas incorporados a Campos de Castilla, Unamuno nos seus artigos escritos durante a I Guerra Mundial ou na obra ensaística de Pío Baroja).
Centros de reunião
Benavente e Valle-Inclán presidiam tertúlias no Café de Madrid, frequentadas por Rubén Darío, Maeztu e Ricardo Baroja. Pouco depois, Benavente e os seus seguidores foram à Cervecería Inglesa, enquanto Valle-Inclán, os irmãos Machado, Azorín e Pío Baroja tomavam o Café de Fornos. O engenho de Valle-Inclán levou-o depois a presidir a tertúlia do Café Lyon d'Or e a do novo Café de Levante, sendo a que maior número de participantes congregou.
Revistas
Os autores de 98 agruparam-se em torno a algumas revistas características. Don Quijote (1892-1902), Germinal (1897-1899), Vida Nueva(1898-1900), Revista Nueva (1899), Juventud (1901-1902), Electra (1901), Helios (1903-1904) e Alma Española (1903-1905).
Livros de memórias
Não foram muito fãs os autores de 98 a falar dos seus companheiros. Pío Baroja deixou bastantes lembranças deles em dois livros de memórias, Juventud, egolatría e Desde la última vuelta del camino. Ricardo Baroja fez o próprio em Gente del 98. Unamuno deixou vários textos autobiográficos sobre a sua juventude, mais poucos sobre a sua idade madura.
Características
Os autores da geração mantiveram, ao menos a princípio, uma estreita amizade e opuseram-se à Espanha da Restauração; Pedro Salinas analisou até que ponto podia considerar-se verdadeiramente uma geração dum ponto de vista histórico. O indiscutível é que compartilham uma série de pontos em comum:
1. Distinguiram entre uma "Espanha real" miserável e outra "Espanha oficial" falsa e aparente. Sua preocupação pela identidade do espanhol está na origem do chamado debate sobre o Ser da Espanha, que continuou nas seguintes gerações.
2. Sentem um grande interesse e amor pela Castela miserável das povoações abandonadas e poentas; revalorizam a sua paisagem e as suas tradições, a sua linguagem castiça e espontânea. Percorrem os dois planaltos castelhanos escrevendo livros de viagens e ressuscitam e estudam os mitos literários espanhóis e o Romancero.
3. Quebram e renovam os moldes clássicos dos gêneros literários, criando novas formas em todos eles. Na narrativa, a nivola unamuniana, o romance impressionista e lírica de Azorín, que experimenta com o espaço e o tempo e faz viver o mesmo personagem em várias épocas; o romance aberto e desagregado de Baroja, influenciado pelo folhetim, ou o romance quase teatral de Valle-Inclán. No teatro, o esperpento e o expressionismo de Valle-Inclán ou os dramas filosóficos de Unamuno.
4. Recusam a estética do Realismo e o seu estilo de frase ampla, de elaboração retórica e de caráter miúdo e detalhista, preferindo uma linguagem mais próxima à língua da rua, de sintaxe mais curta e caráter impressionista; recuperaram as palavras tradicionais e castiças campesinas.
6. O pessimismo é a atitude mais corrente entre eles, e a atitude crítica e descontenta faz que simpatizem com românticos como Mariano José de Larra, ao que dedicaram uma homenagem.
Por um lado, os intelectuais mais modernos, secundados às vezes pelos próprios autores criticados, defendiam que a "geração de 98" se caracterizava por um aumento do egotismo, por um precoce e excitante sentimento de frustração, pela exageração neo-romântica do individual e pela sua imitação servil das modas europeias por enquanto.
Pelo outro lado, para os escritores da esquerda revolucionária da década de 1930, a interpretação negativa da rebeldia de 98 une-se a uma fundamentação ideológica: o espírito de fim-de-século, de protesto responde ao sarampo juvenil de um setor da pequena burguesia intelectual, condenado a refluir numa atitude espiritualista e equívoca, nacionalista e anti-progressiva. Ramón J. Sender mantinha ainda em 1971 a mesma tese (embora com supostos diferentes).
Os problemas à hora de definir a "geração de 98" sempre foram (e são) numerosos já que não se pode abranger a totalidade de experiências artísticas de uma extensa trajetória temporária. A realidade do momento era muito complexa e não permite entender a geração baseando-se na vivência comum de uns mesmos fatos históricos (ingrediente básico de um fato geracional). Isto é devido a um triplo motivo:
A crise política de finais do século XIX afetou bastantes mais escritores dos que são englobados na "geração de 98".
Não se pode restringir a experiência histórica dos autores nascidos entre 1864 e 1875 (datas de nascimento de Unamuno e Machado) ao ressentimento nacionalista produzido pela perda das colônias. Afiançava-se, além disso, por aqueles anos na Espanha uma comunidade social e econômica quase moderna.
O grupo de comentaristas "intelectuais" do desastre de 98 rondavam os 50 anos de idade e as suas perspectivas profissionais atingiram a sua cimeira (ou estavam fazendo-o). Os mais velhos acercam-se à idade de Galdós e os mais novos à de Unamuno. Isto significa, em contraste com a "geração de 98", que se formaram espiritualmente nos tempos da Revolução de Setembro.
O importante de considerá-los em conjunto é o fato de viverem duas épocas emocional e intelectualmente diferentes.
A revolucionária: efervescência ideológica, afã de reforma e confiança na virtude corretora dos programas políticos.
A restauradora: atonia dos espíritos, o apoucamento com que se abordam iniludíveis problemas, a suspeita que inspira toda ideia de câmbio e a crescente desconfiança na política vigente.
Trata-se, pois, de homens duplamente enganados já que viram fracassar duas estruturas políticas de aspecto contraditório (Revolução e Restauração). Destes dois experimentos políticos os intelectuais de 98 tiraram uma mesma conclusão: a urgência de buscar em zonas de pensamento e atividade alheias à política os meios de resgatar a Espanha da sua progressiva catalepsia [morte aparente].
A primeira repulsa intelectual teve lugar nos albores da Restauração. Em 1876 Francisco Giner de los Ríos funda a Institución Libre de Enseñanza. Sua tarefa constitui o repúdio indireto do ensino oficial, provadamente ineficaz e insuficiente naquela época, e sujeito à agonizante tutoria dos interesses políticos e religiosos.
Apresentou-se então o problema da pessoalidade histórica da Espanha (bem como o fizeram na França pouco antes da derrota de Sedan). Unamuno estudou o casticismo, Ricardo Macías Picavea a "perda da pessoalidade", Rafael Altamira a psicologia do povo espanhol, Joaquín Costa a pessoalidade histórica da Espanha.
Análogos europeus
Os autores de 98 têm evidentes paralelos europeus:
O quietismo de Unamuno remete aos problemas vividos por André Gide.
Azorín reúne a sensibilidade reacionária para o passado cultural (típica da Itália) e teatral.
O jornalismo, em tanto prática literária habitual, e a condição intelectual, em tanto talante pessoal, desenvolvem uma nova modalidade ensaística, ajustada a uma temática na que a evocação ou o confessional enquadram temas de reflexão muito característicos.
As crises do romance e do teatro são vividas com peculiar intensidade na nivola unamuniana, o desmoronamento do conto em Azorín ou pela peculiar teoria narrativa de Baroja.
Bibliografia
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