Segundo registros históricos, entre 1880 e 1959, 110.243 cidadãos russos imigraram para o Brasil, com picos na década de 1890, quando entraram 41.416, e na década de 1910, quando entraram 39.288. Todavia, a maioria desses imigrantes não era de etnia russa, mas de outras etnias, predominantemente polonesa. Naquela época, o Estado polonês não existia, e boa parte do seu território fazia parte da Rússia. Quando chegavam ao Brasil, esses imigrantes eram contabilizados como "russos". Porém, na década de 1920, a Polônia ressurgiu como Estado nacional. Verifica-se que, a partir desse momento, a imigração "russa" praticamente desaparece das estatísticas brasileiras, o que indica que esses imigrantes passaram a ser corretamente contabilizados como "poloneses", e não mais como "russos".[9]
O número de russos propriamente dito que emigraram para o Brasil foi pequeno. Um exemplo é o estado do Rio Grande do Sul. Nas estatísticas, esse estado aparece como se tivesse recebido significativa imigração "russa", porém a presença cultural russa é muito pequena no estado. Na verdade, esses imigrantes eram predominantemente poloneses, ucranianos e rutenos, além de colonos de língua alemã da Pomerânia e da Silésia.[11][12][13]
História
De 1828 a 1890 cerca de 1 milhão e 130 mil pessoas deixaram o Império Russo. Entre 1890 a 1915, o aumento foi consideravelmente significativo, onde 3 milhões e 300 mil pessoas deixaram a região. Já após a Revolução de 1917, o fluxo continuou, com 2,5 milhões de pessoas que saíram da Rússia.[14]
Outra considerável onda migratória ocorreu na década de 1910, onde muitas famílias deixaram a Rússia por diversos motivos, entre eles, econômicos, políticos e religiosos. Essas pessoas, embora consideradas russas, tinham diversas origens étnicas. Além de russos, entre eles tinham também povos germânicos e eslavos (ucranianos, polacos, tchecos, eslovacos, eslovenos, bielorrussos, búlgaros).[16][17] Alguns imigrantes russos chegaram até mesmo sem cidadania e vieram com a ajuda da International Refugee Organization (IRO). Algumas famílias russas eram refugiadas na Itália, Alemanha e Áustria.[14][3]
De acordo com a pesquisadora Anastassia Bytsenko, antes da revolução, em 1908, Janis Guttmann publicou na Rússia o livro Jizn kolonisstov v chtate São Paulo v Brasilii (A vida dos colonos no Estado de São Paulo do Brasil), e, em 1909, Ivan Rébrin publicou O peresselenii v Brasiliu (Sobre a imigração para o Brasil).[14] A publicação de Guttmann servia como propaganda do Brasil para colonos russos que tinham interesse em migrar para a América Latina. As terras brasileiras eram apresentadas como verdadeiros paraísos e tidas como "Eldorado". Já a publicação de Rébrin era uma contrapropaganda que criticava o Brasil e apresentava seus diversos problemas.[14]
Durante o ano de 1921, 1526 russos entraram no Brasil. Em 1922 cerca de 200 imigrantes russos, sendo a maioria ex-integrantes do Exército Branco, desembarcaram no porto de Santos. Muitas famílias se instalaram no estado de São Paulo e outras se instalaram no sul do Brasil. De 1917 a 1941 vieram 12210 russos para o Brasil e foram distribuídos em diversas colônias e cidades. Entre os anos de 1944 e 1953, aproximadamente 2224 imigrantes russos chegaram ao Brasil vindos da China.[14][3]
Conforme informações da Embaixada da Federação Russa no Brasil e dos consulados, 35 mil russos residiam no Brasil em 2018.[1] Segundo Igor Chnee, autor do livro Imigrantes Russos no Brasil, haveria 1,8 milhão de descendentes de imigrantes e refugiados russos viviam no Brasil, na década de 2010, porém ele não explica como chegou a esse número.[2][18] Os estados brasileiros que mais concentram os descendentes são: Rio Grande do Sul, São Paulo, Goiás e Paraná, além de presença também no Rio de Janeiro, Santa Catarina e Pernambuco. Em São Paulo a comunidade fundou a Associação Russo Brasileira (ARB) que busca resgatar e preservar a cultura desses descendentes.[2]
Imigração russa no Paraná
O Paraná é um estado que recebeu um significativo número de imigrantes russos.[19] Cidades como Curitiba, Ponta Grossa e Londrina, registraram a presença de famílias russas que imigraram para o Brasil.[5][7][14] A região dos Campos Gerais do Paraná foi contemplada por três principais grandes núcleos de colônias de russos-alemães do Volga. Em Ponta Grossa “Otávia”, em Palmeira “Sinimbú” e na Lapa as colônias de “Marienthal”, “Johannesdorf” e “Virmond”.[15][20]
Entre 1877 e 1878 chegaram em Ponta Grossa 2381 russos-alemães que se estabeleceram na Colônia Octávio, subdividida em 17 núcleos na área rural, afastados do centro urbano.[19] Na mesma época a Colônia Sinimbú de Palmeira recebeu 240 famílias de alemães do Volga, sendo 471 católicos e 291 protestantes. As famílias foram divididas em núcleos católicos e protestantes como: Pugas, Lago, Santa Quitéria, Alegrete, Papagaios Novos e Quero-Quero.[20][14]
Em Curitiba famílias de imigrantes vindas da Rússia chegaram no ano de 1912 e se juntaram as outras comunidades eslavas e germânicas.[21] Em 1958 a região de Ponta Grossa recebeu cerca de 100 pessoas fugindo da Revolução Russa[2] e fundaram a Colônia Santa Cruz.[5][14][22] A comunidade ainda preserva os costumes, o calendário, o idioma e a religião ortodoxa.[5][23] É comum na comunidade o uso de trajes típicos no dia a dia, onde as mulheres usam vestidos longos. As casadas usam lenço na cabeça e as solteiras cabelos trançados.[5] Já os homens deixam a barba crescer e adotam camisas brancas, calças compridas e um cinto de corda amarrado na cintura. Com o passar dos anos, alguns acabaram migrando para os Estados Unidos e para o Canadá, se estabelecendo em outras colônias do mesmo grupo étnico.[5][24]
As colônias estabelecidas no Paraná, em sua grande maioria, não prosperaram devido a muitos problemas.[15] Pode ser destacado fatores como a baixa fertilidade do solo, o que consequentemente gerava o insucesso nas lavouras de trigo, principal plantação cultivada pelos imigrantes. Vale lembrar também a não adaptação aos costumes brasileiros, e o fato de que muitos imigrantes rumaram para as cidades em busca de novas oportunidades de trabalho, contribuindo para o enfraquecimento dos núcleos coloniais.[15]
Imigração russa em São Paulo
Os primeiros russos que chegaram no estado de São Paulo desembarcaram no porto de Santos em 1905 e se dirigiram para o interior. As famílias fundaram uma colônia na Fazenda Pombal, no município de Nova Odessa.[14] A iniciativa foi incentivada pelo governo, bem como pela secretaria de Agricultura, com o comando de Carlos Botelho, que a partir de 1904 implantou uma política de criação de núcleos coloniais no interior do estado.[18] A partir de 1905 a colônia de Nova Odessa passou a receber novos grupos de imigrantes russos, além de ucranianos e letões, contabilizando cerca de 300 pessoas.[25] Posteriormente muitos que chegaram na colônia agrícola e que não tinham aptidão para a agricultura acabaram migrando para as cidades.[26]
Entre 1947 e 1949, cerca de 760 russos e 808 apátridas entraram no estado de São Paulo.[3] Entre 1947 e 1958 aproximadamente 1840 russos entraram em São Paulo. Desses, 949 imigrantes russos se dirigiram para a cidade de São Paulo. Outras cidades ao redor de São Paulo também receberam imigrantes russos: São Caetano do Sul 72 imigrantes, Osasco 60 imigrantes, Santo André 34 imigrantes, Guarulhos 15 imigrantes, Carapicuíba 12 imigrantes, Jundiaí 10 imigrantes, Campinas 9 imigrantes, Mogi das Cruzes 8 imigrantes e Amparo 6 russos. A maioria dos russos desse período não desenvolvia atividades agrícolas e foram absorvidos pela mão de obra dos polos industriais do estado.[3] Na capital paulista, as famílias russas se concentravam em diversos bairros da cidade, como: Barra Funda, Indianópolis, Ipiranga, Vila Alpina, Vila Anastácio, Vila Bela, Vila Maria e Vila Zelina.[3] Na Vila Zelina, na região da Zona Leste, formou-se uma grande comunidade de descendentes de imigrantes de países do leste europeu, entre eles, muitas famílias de russos.[27][28][29] Na capital, desde 1931 já exista a Paróquia Ortodoxa Russa de Santíssima
Trindade, na Vila Alpina. Diversas igrejas ortodoxas russas foram construídas na região, como em Carapicuíba construída em 1949, e em Moema e Indianópolis, construídas em 1952. A igreja da Vila Zelina foi construída pela comunidade russa somente em 1962.[3]
Imigração russa no Rio Grande do Sul
Registros contabilizaram que, entre 1909 e 1912, entraram no Rio Grande do Sul 19.525 imigrantes russos.[30] Contudo, boa parte desses imigrantes não era de etnia russa, mas sim poloneses e ucranianos que foram contabilizados nas estatísticas como "russos", porquanto, na época, boa parte das atuais Polônia e Ucrânia faziam parte do Império Russo.[11][12] Em 1909, famílias russas vindas da região da Sibéria chegaram no Rio Grande do Sul e se estabeleceram no interior do estado.[30] Esses russos eram agricultores e procuravam uma região onde pudessem cultivar alimentos, sendo assim, fundaram uma colônia na região noroeste, a 400 km de Porto Alegre. Posteriormente a região também recebeu imigrantes alemães e as colônias deram origem ao município de Campina das Missões, onde aproximadamente 1500 pessoas são descendentes de colonos russos de acordo com informações do ano de 2018.[30] Uma das primeiras igrejas ortodoxas russas no Brasil foi erguida na colônia de Campina das Missões em 1912, que, junto com a religiosidade, mantém também o idioma, sendo ensinado as crianças.[30][31]
Imigração russa em Mato Grosso
Na década de 1970, um grupo de aproximadamente 350 famílias de velhos crentes russos deixaram a Colônia Santa Cruz, em Ponta Grossa, e fundaram a Colônia Russa, no município de Poxoréu. Anos mais tarde, a área da colônia foi desmembrada junto com o distrito dando origem ao município de Primavera do Leste, em Mato Grosso. Os colonos ocuparam a região ao serem motivados pelo incentivo de colonização e a viabilidade de adquirir terras com preços acessíveis. A área da colônia é estimada em 60 mil hectares. Inicialmente desenvolviam a agricultura familiar e posteriormente foram aderindo ao agronegócio, cultivando soja, além de feijão, milho, algodão e girassol. Algumas famílias também se dedicam a pecuária. Na década de 2010 a comunidade era formada por aproximadamente 120 famílias. Muitas famílias também remigraram para outras regiões do Brasil e outros países.[32][33]
Cultura
De modo geral, os descendentes de russos se organizaram em grupos etno-religiosos, onde buscaram manter a cultura. Tradições e costumes, como a língua, a religião, o artesanato e a culinária, ainda podem ser observados em núcleos familiares, além de terem contribuído para influenciar a cultura brasileira.[1] Algumas comunidades ainda preservam, por exemplo, grupos folclóricos de dança.[31] No aspecto religioso, essas famílias eram católicas, protestantes e, principalmente, da fé ortodoxa, uma característica marcante dessa herança cultural devido aos ritos e liturgias.[5][31][20]
Na culinária, muitas famílias russas tiveram que adaptar alguns hábitos alimentares, com a indisponibilidade de produtos e recursos como no preparo da sliotka, prato típico feito a base de peixe salgado.[34] Algumas comunidades fazem o kotlete, um tipo de bolinho de carne, e o blini, uma massa recheada.[31] Diversos pratos brasileiros receberam influência da culinária russa. Os mais conhecidos são o estrogonofe e a salada olivier, também denominada de salada russa, salada de batatas ou salada de maionese.[35][36] Entre as bebidas, é comum observar chá quente servido no samovar e bebidas destiladas como a tradicional vodca.[31]
↑ abcDepartamento de História da UEPG (1 de novembro de 2018). «Alemães do Volga, estabelecimento em Palmeira». Dicionário Histórico e Geográfico dos Campos Gerais. Consultado em 11 de janeiro de 2022