Professor liceal (vejam-se as referências em Manhã Submersa e Aparição), foi como escritor que mais se distinguiu. O seu nome continua actualmente associado à literatura através da atribuição do Prémio Vergílio Ferreira. Em 1992, foi galardoado com o Prémio Camões.[1]
A sua vasta obra, geralmente dividida em ficção (romance, conto), ensaio e diário, costuma ser agrupada em dois períodos literários: o Neo-Realismo e o Existencialismo. Considera-se que Mudança é a obra que marca a transição entre os dois períodos.
Biografia
Vergílio Ferreira nasceu em Melo, aldeia do concelho de Gouveia, na Beira Alta, a meio da tarde do dia 28 de janeiro de 1916,[2][3] filho de António Augusto Ferreira, fogueteiro, e de Josefa Ferreira, doméstica, que, em 1927, emigraram para o Canadá (ou Estados Unidos), em busca de uma vida melhor, ficando Vergílio com os irmãos mais novos, César e Judite. Esta dolorosa separação é descrita em Nítido Nulo. A neve - que virá a ser um dos elementos fundamentais do seu imaginário romanesco - é o pano de fundo da infância e adolescência passadas na zona da Serra da Estrela. Aos 12 anos, após uma peregrinação a Lourdes, entra no seminário do Fundão,[4] que frequentará durante seis anos. Esta vivência será o tema central de Manhã Submersa.
Em 1936, deixa o seminário e acaba o Curso Liceal no Liceu da Guarda.[5] Entra para a Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, continuando a dedicar-se à poesia,[6] nunca publicada, salvo alguns versos lembrados em Conta-Corrente e, em 1939, escreve o seu primeiro romance, O Caminho Fica Longe. Licenciou-se em Filologia Clássica em 1940. Concluiu o Estágio no Liceu D. João III (1942), em Coimbra. Começa a leccionar em Faro. Publica o ensaio "Teria Camões lido Platão?" e, durante as férias, em Melo, escreve "Onde Tudo Foi Morrendo". Em 1944, passa a leccionar no Liceu de Bragança, publica "Onde Tudo Foi Morrendo" e escreve "Vagão "J" que, publicou em 1946, no mesmo ano em que se casou, com Regina Kasprzykowsky, professora polaca refugiada em Portugal, com quem Vergílio ficará até à sua morte. Após uma passagem pelo liceu de Évora (onde escreveu o mundialmente conhecido romance "Aparição", corria o ano de 1953), fixa-se como docente em Lisboa, leccionando o resto da sua carreira no Liceu Camões.
A 4 de fevereiro de 1989, foi agraciado com o grau de Grã-Cruz da Ordem do Mérito.[9]
Em 1992 foi eleito para a Academia das Ciências de Lisboa; no mesmo ano recebeu, pelo conjunto da obra, o "Prémio Camões", o mais importante prémio literário dos países da língua portuguesa.[6]
Vergílio morreu no dia 1 de março de 1996,[2] em sua casa, em Lisboa, na freguesia de Alvalade. O funeral foi realizado no cemitério de Melo, sua terra-natal, porém, o seu pedido para que o caixão onde fora enterrado, ficasse virado para a Serra da Estrela, não foi exatamente concretizado.[10]
Existencialismo
“
Um cantor fixa um tema. Mas esse tema, revelando, como revela, um interesse, revela sobretudo que foi só dele que o artista pôde realizar-se como tal.
”
Atravessa a sua obra o discurso da alegria e felicidade, como um dos aspectos mais profundos da condição humana, sempre acompanhado pelo ruído das escadas da sua antiga casa, que advém do abandono da sua primeira namorada.
Diários
Durante treze anos (1981-1994) Vergílio Ferreira publicou nove volumes de diário,[11] ao qual pôs o título genérico de Conta-Corrente. Os textos contidos nesses volumes vão desde Fevereiro de 1969 (altura em que iniciou a sua escrita) até Dezembro de 1992 (altura em que terá abandonado o género). Os volumes subdividem-se em duas séries: a primeira composta por cinco volumes e a segunda composta por quatro volumes.
A publicação do diário de Vergílio Ferreira foi uma das poucas tempestades na bonançosa comunidade literária pós 25 de abril, como também é «um documento precioso sobre a evolução da ideias do século XX português. Vergílio Ferreira era um homem atento a tudo aquilo que o rodeava, quer tivesse interesse político, ou social, ou estético, ou literário. O seu diário veio, assim, agitar a comunidade portuguesa pensante, criando alguns focos de conflito por um lado e manifestações de apoio por outro.
O autor já tinha por várias vezes tentado escrever um diário, mas foi só em 1969 que leva o seu projecto em frente: «Fiz cinquenta e três anos há dias. (…) É a opinião do Registo Civil (…). E então lembrei-me: e se eu tentasse uma vez mais o registo diário do que me foi afectando?». Esta frase é sem dúvida elucidativa das intenções do autor: primeiro, tentar escrever um registo diário; segundo, escrever nele tudo aquilo que o foi marcando. Nesta frase também se pode verificar que não é a primeira vez que o autor tenta escrever um diário: «e se eu tentasse mais uma vez».
O tentar escrever um diário é algo que está sempre presente, e, muitas vezes, a escrita desse mesmo diário torna-se difícil, pois o autor sente que se está a expor em demasiado perante o leitor, sente que o leitor pode “lê-lo”: «Extremamente difícil continuar este diário.(…) Que me leiam um romance, não me perturba. Mas não que me leiam a mim.» Existe a questão do íntimo sempre presente ao longo deste volume e o próprio autor refere que colocar ao alcance dos seus leitores a sua intimidade, os seus desabafos, não é propriamente algo que lhe agrada: «o desejo de “desabafar” não é propriamente um desejo sublime».
Obras
Ficção
1938 A curva de uma vida (póstumo 2010, do espólio)
↑Martins, Luís; Ramos, Susana. «Manhã Submersa»(PDF). Universidade de Lisboa. Faculdade de Ciências. Arquivado do original(PDF) em 10 de junho de 2007A referência emprega parâmetros obsoletos |coautores= (ajuda)
Afonso Borregana, António (1999). Aparição de Vergílio Ferreira: o texto em análise 2ª ed. [S.l.]: Texto Editora. 62 páginas. ISBN9724711889
Barbosa Machado, José (2014). Estudos de Literatura e Cultura Portuguesas revisada ed. Braga: Edições Vercial. 221 páginas. ISBN9898392258
Rodrigues de Paiva, José (2007). Vergílio Ferreira: Para sempre, romance-síntese e última fronteira de um território ficcional. [S.l.]: Editora Universitária UFPE. 720 páginas. ISBN8573154594
Silva Gordo, António da (1995). A escrita e o espaço no romance de Vergílio Ferreira. Porto: Porto Editora. 128 páginas. ISBN9720340835