Doris Lessing
Doris Lessing CH, nascida Doris May Tayler (Quermanxá, 22 de outubro de 1919 — Londres, 17 de novembro de 2013), foi uma escritora britânica. Autora de obra prolífica, que inclui trabalhos como as novelas The Grass is Singing e The Golden Notebook, sua obra cobre um vasto leque estilístico, indo da autobiografia à ficção científica, com claras influências do modernismo. Foi galardoada com o Nobel de Literatura de 2007, tendo a Academia Sueca apontado, como razão determinante, a existência na sua obra de características que fazem dela "a contadora épica da experiência feminina, que com cepticismo, ardor e uma força visionária escrutinou uma civilização dividida".[1] Doris Lessing é a 11.ª mulher a ganhar este galardão nos seus 89 anos de história[2][3] e a pessoa mais idosa que jamais o recebeu.[4] BiografiaDoris Lessing foi oficialmente batizada como Doris May Tayler, em Quermanxá,[5] no Curdistão iraniano, onde viveu até os seis anos de idade.[6] Filha do capitão Alfred Tayler e de sua mulher Emily Maude Tayler (nascida McVeagh), ambos cidadãos britânicos nascidos na Inglaterra.[7] O seu pai tinha perdido uma perna durante a sua participação na Grande Guerra, e fora durante a sua convalescença da amputação que conhecera a sua futura esposa, então enfermeira no Royal Free Hospital de Londres.[8][9] Após a Guerra, Alfred Tayler, que antes fora bancário, aceitou um emprego no Imperial Bank of Persia, que era um banco britânico[10] que operou como banco estatal e banco central do Irã, entre 1889 e 1929,[11] por concessão do governo iraniano ao banqueiro Paul Julius Reuter. Assim, a família Tayler mudou-se para Quermanxá, Irã (geralmente chamado Pérsia, no Ocidente, até 1930), onde Doris Lessing nasceu em 1919.[12][13] Em 1925, quando a comissão de serviço terminou, a família mudou-se para a colónia britânica da Rodésia do Sul (hoje o Zimbabwe), onde havia adquirido cerca de mil acres (cerca de 405 ha) de matagal e o pai se pretendia fixar como agricultor, cultivando ali milho e tabaco. Apesar da rudeza do ambiente que a rodeava, a mãe de Lessing pretendia levar na nova fazenda uma vida eduardiana, o que talvez pudesse ter sido possível se a exploração prosperasse, o que não aconteceu, já que a fazenda, apesar do investimento e do esforço, não conseguiu atingir as expectativas criadas.[6] Doris foi educada na Escola Secundária do Convento Dominicano de Salisbúria (actual Harare), uma escola confessional só para raparigas operada pelas irmãs dominicanas.[14] Nunca tendo gostado do ambiente criado pelas freiras que administravam a escola e em conflito permanente com a sua mãe, Doris abandonou a escola aos 13 anos, sendo autodidacta em toda a sua formação posterior. Com o agudizar do conflito com a mãe, abandonou a casa aos 15 anos de idade, passando a trabalhar como ajudante de ama, tomando conta das crianças de uma família. Por essa altura começou a ler materiais sobre política e sociologia que lhe eram emprestados pelos patrões.[9] Por essa época, começou a escrever. Em 1937, Doris mudou-se para Salisbúria para trabalhar como telefonista, casando em 1939 com Frank Charles Wisdom, com quem teve dois filhos (um filho e uma filha), antes do casamento se desfazer em 1943,[9] quando o casal se separa ficando as crianças com o pai. Após o seu divórcio, Doris é atraída para o Left Book Club, um círculo de leitores de inspiração comunista,[6] tendo aí encontrado o seu segundo marido, o alemão Gottfried Lessing,[15] que viria mais tarde a ser nomeado embaixador da República Democrática Alemã no Uganda, onde foi assassinado em 1979 durante a rebelião contra Idi Amin Dada.[9] Casaram em 1945 e tiveram um filho (Peter Lessing) pouco antes do casamento ter acabado em novo divórcio no ano de 1949. Doris, que optou por manter o apelido germânico do segundo marido, partiu então para Londres na companhia do filho. Pouco depois de se fixar em Londres com o filho Peter, Doris Lessing publica o seu primeiro romance, The Grass Is Singing (A Canção da Relva), saído a público ainda em 1949. O seu livro mais famoso, e que representaria o seu lançamento como escritora consagrada, foi The Golden Notebook (O Carnê Dourado), publicado em 1962. Devido às campanhas públicas contra as armas nucleares e contra o regime de apartheid na África do Sul, Doris Lessing foi banida daquele país e da Rodésia durante muitos anos.[16] Lessing foi uma crítica áspera do thatcherismo. Para demonstrar as dificuldades enfrentadas por novos autores que queiram ver os seus livros editados, em 1984, tentou publicar duas novelas sob o pseudónimo de Jane Somers. As novelas foram rejeitadas pelo seu editor britânico, mas aceitas por outro, Michael Joseph, e pela editora americana Alfred A. Knopf.[17] A obra The Diary of a Good Neighbour[18] foi publicada em 1983, e If the Old Could em 1984,[19] tendo saído no Reino Unido e nos Estados Unidos da América ambas como escritas "Jane Somers”. Em 1984, ambas as novelas foram republicadas (Viking Books), como um volume único, sob o título de The Diaries of Jane Somers: The Diary of a Good Neighbor and If the Old Could, indicando Doris Lessing como a autora. Doris Lessing declinou ser feita dama, mas aceitou receber a ordem honorífica da Order of the Companions of Honour nos finais de 1999 pelo seu conspícuo serviço à nação.[20] Foi também feita Companion of Literature pela Royal Society of Literature.[21] A 11 de Outubro de 2007, Doris Lessing foi anunciada como agraciada do Nobel de Literatura.[22] Com 87 anos de idade, ela é a pessoa mais idosa que jamais recebeu aquele galardão[23] e o terceiro laureado mais idoso em qualquer das categorias do Prémio.[24][25] Doris Lessing é a 11.ª mulher a receber o Nobel de Literatura nos seus 106 anos de história.[26] Quando confrontada com a notícia de ser a galardoada de 2007, Doris Lessing disse aos repórteres que se tinham congregado frente à sua casa: "Ganhei todos os prémios existentes na Europa, todos sem excepção, por isso estou encantada por ganhá-los todos. É uma abada geral."[27] O prémio vale £ 765 000 (cerca de € 900 000).[22] Doris Lessing faleceu na sua casa de Londres em 17 de novembro de 2013.[28][29] Análise literáriaOs temas abordados por Doris Lessing variam extensamente, passando pelo exame das tensões inter-raciais, a política racial, a violência contra as crianças, os movimentos feministas e a exploração do espaço exterior. A produção literária de Lessing é em geral dividida em três fases distintas, embora interrelacionadas e intercorrentes:
Na série Canopus em Argos: Arquivos, Doris Lessing conduz o leitor ao mundo dos Impérios de Canopus e Sirius, num universo que aborda a colonização de planetas em esferas muito além do mundo físico das naves espaciais. Por isso mesmo a literatura de Doris Lessing tem sido denominada de ficção espacial. Com a série Canopus em Argos: Arquivos, Doris Lessing transcendeu o realismo completamente, contudo restabelecendo-o dentro de um ajuste do espaço-tempo. Criou o que chama um mundo novo para mim mesma, autoconsistente e com possibilidades infinitas, um reino onde os mitos e lendas dos planetas deixaram de ser apenas manifestações de indivíduos sozinhos, onde sobrevêm os aspectos das rivalidades e das interacções do Império de Canopus com os outros impérios galácticos, Sirius, e seu inimigo, o império Puttoria, com seu planeta criminoso, Shammat. Quando inquirida sobre qual dos seus livros considerava mais importante, Doris Lessing escolheu a série de ficção científica intitulada Canopus in Argos. Aquelas obras demonstram, de muitas perspectivas diferentes, os esforços de uma sociedade avançada em forçar o passo da evolução (veja também Progressor e Uplift Universe). A série Canopus é parcialmente baseada em conceitos do Sufismo, nos quais Lessing foi introduzida por Idries Shah. Trabalhos de ficção anteriores sobre o tema do espaço interior, como Briefing for a Descent into Hell e Memoirs of a Survivor também exploram esses temas. A entrada de Lessing no campo da ficção científica não caiu bem entre muitos críticos literários. Por exemplo, no New York Times, em 1982, o crítico John Leonard escreveu sobre The Making of the Representative for Planet 8 que: "Um dos muitos pecados pelos quais o século XX será responsabilizado é o de ter desencorajado a Sr.ª Lessing.... Ela agora faz propaganda em favor da nossa insignificância no razzmatazz cósmico.” A essa afirmação Lessing replicou: "O que eles não entenderam foi que a ficção científica é alguma da melhor ficção social dos nossos tempos. Também admiro a ficção científica clássica, como Blood Music, de Greg Bear. Ele é um grande escritor ".[30] Ao contrário de alguns autores, conhecidos principalmente pelos seu trabalho considerado como parte da mainstream social da sua época, Doris Lessing nunca hesitou admitir que escreve ficção científica. Ela foi mesmo a autora convidada de honra na 45.ª World Science Fiction Convention, a Worldcon, fazendo aí um discurso muito bem recebido, no qual descreveu a sua obra de ficção científica Memoirs of a Survivor como "uma tentativa de autobiografia".[31] A sua novela The Golden Notebook é considerada um clássico feminista por alguns estudiosos, mas não pela própria autora, que mais tarde escreveu que o tema da novela, centrado na análise de estados de ruptura mental como forma de obter uma cura das angústias próprias e de se auto-libertar de ilusões, tinha sido mal compreendido pelos críticos. Ela também lamenta que os críticos tenham ignorado a estrutura excepcional da novela. Como ela explica em Walking in the Shade, Lessing modelou Molly, em grande parte, sobre a sua boa amiga Joan Rodker, filha do autor e editor John Rodker.[32] Doris Lessing não gosta da ideia de ser considerada como uma autora feminista. Quando inquirida sobre essa asserção, respondeu:
A maior parte do arquivo literário de Doris Lessing é mantida pelo Harry Ransom Humanities Research Center, um centro de investigação na área das humanidades integrado na University of Texas at Austin. As 45 caixas de arquivo ali existentes representam a quase totalidade dos manuscritos e originais dactilografados no período anterior a 1999. Crê-se que os originais dos primeiros livros de Lessing não existam, porque a escritora não guardava os seus manuscritos.[34] Outras instituições, como a McFarlin Library da University of Tulsa mantêm colecções menores.[35] Prémios
Nobel de Literatura 2007Para receber o Prémio Nobel da Literatura de 2007, a escritora escreveu um discurso e enviou-o à sua editora sueca, que o leu na cerimónia na capital sueca.[37] Doris Lessing disse num programa de rádio da BBC em Maio de 2008 que o facto de ter recebido o prestigiado prémio em 2007 redundou num "maldito desastre". Isto porque a subsequente atenção dos media, com constantes pedidos para entrevistas e sessões de fotografia, lhe tirou toda a energia para escrever uma linha que seja.[3] Crítica à atribuição do Prémio NobelA crítica literária em geral recebeu a concessão do Nobel de Literatura a Doris Lessing com surpresa e cepticismo, devido a que não aparecia entre os cotados para o galardão de 2007, apesar de ser uma eterna candidata. Autores como Ana María Moix,[38] Rosa Montero,[39] José María Guelbenzu,[40] ou Mario Vargas Llosa[41] louvaram seus méritos literários depois da concessão do galardão. Contudo, algumas vozes críticas levantaram-se contra esta decisão:
Obras publicadasSão as seguintes, ordenadas cronologicamente, as obras publicadas por Doris Lessing:
Referências
Ligações externas
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