Em 1946, Furtado ingressou no curso de doutorado em Economia da Universidade de Paris-Sorbonne, concluído em 1948 com uma tese sobre a economia brasileira no período colonial.[4] Nesta estadia em Paris, conheceu sua primeira esposa, a química argentina Lucia Piave Tosi. Retornou ao Brasil, trabalhando no DASP e na Fundação Getúlio Vargas.[5]
Em 1949 mudou-se para Santiago do Chile, para integrar a recém-criada Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), órgão das Nações Unidas. Sob a direção do economista argentino Raúl Prebisch, a CEPAL se tornaria naquele período um centro de debates sobre os aspectos teóricos e históricos do desenvolvimento. Em Santiago do Chile, naquele ano, nasceu seu primeiro filho, Mario Tosi Furtado.
Entre 1953 e 1955, presidiu no Rio de Janeiro o Grupo Misto CEPAL-BNDES[6], que elaborou um estudo sobre a economia brasileira que serviria de base para o Plano de Metas do governo de Juscelino Kubitschek. De volta a Santiago, como diretor da Divisão de Desenvolvimento da CEPAL, dirigiu estudos econômicos sobre o México, onde morou, e a Venezuela. Em 1954 nasceu seu segundo filho, André Tosi Furtado.
Em 1957, foi fazer estudos de pós-doutoramento com o professor Nicholas Kaldor no King's College da Universidade de Cambridge, Inglaterra. Neste período, escreveu Formação Econômica do Brasil (publicado no Brasil em 1959), que se tornou um clássico da historiografia econômica brasileira, e que retrata possibilidades de intervenção racional do Estado no processo de desenvolvimento econômico.[7]
Furtado procurou descrever a evolução da economia brasileira dentro do método histórico-estrutural, a partir da análise da estrutura produtiva de cada período histórico da sociedade brasileira, dando ênfase em conceitos analíticos especificamente cepalinos, tais como a visão da economia internacional baseada nas relações entre países centrais, industrializados, e países periféricos, agrícolas.
Voltando ao Brasil, criou a pedido do presidente Juscelino Kubitschek, em 1959, a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE). Em 1962, no Governo João Goulart, foi nomeado o primeiro Ministro do Planejamento do Brasil e foi o idealizador do Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social, no qual procurou estabelecer regras e instrumentos rígidos para o controle do déficit público e refreamento do crescimento inflacionário. Em 1963, retornou à superintendência da SUDENE, criando e implantando a política de incentivos fiscais para investimentos na região.[8]
Com a edição do Ato Institucional nº 1 (AI-1), em 9 de abril de 1964, Celso Furtado foi incluído na primeira lista de cassados, perdendo seus direitos civis e políticos por dez anos, e iniciando um exílio que durou vinte e um anos.[1]
Naquele momento, voltou para Santiago do Chile, a convite do Instituto Latino-Americano para Estudos de Desenvolvimento (Ildes), ligado à Cepal. Em setembro do mesmo ano mudou-se para New Haven, nos Estados Unidos, assumindo o cargo de pesquisador graduado do Centro de Estudos do Crescimento Econômico da Universidade de Yale.[3]
Em 1965, mudou para a Paris, onde se tornou professor na Faculdade de Direito e Ciências Econômicas da Universidade de Paris-Sorbonne, permanecendo na capital francesa por vinte anos, e, dedicando-se também a atividades de ensino e pesquisa nas universidades de Yale, American University e Columbia, nos EUA, e de Cambridge, na Inglaterra.[9]
Na década de 1970, viajou a diferentes países seja em missão das Nações Unidas, seja como conferencista ou professor-visitante e membro do Conselho Acadêmico da Universidade das Nações Unidas, sediada em Tóquio. Dedicou-se intensamente à redação e publicação de livros. Nos meados dessa década, separou-se de sua primeira mulher.
Em 1979, casou-se com sua segunda esposa, a jornalista e tradutora Rosa Freire d'Aguiar, com quem viveu até o final de sua vida.
Em 1981, filiou-se ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB). convidado pelo recém-eleito presidente Tancredo Neves a participar da Comissão do Plano de Ação do Governo (COPAG), e logo em seguida, foi nomeado Embaixador do Brasil junto à Comunidade Econômica Europeia, mudando-se para Bruxelas.
No ano seguinte, foi convidado por José Sarney, que assumiu a presidência com o falecimento de Tancredo Neves, para ser ministro da Cultura, posto em que permaneceu até 1988. À frente do Ministério da Cultura, criou a primeira legislação de incentivos fiscais à cultura.
Nos anos seguintes, retomou a vida acadêmica e participou de diferentes comissões internacionais, como a Comissão Sul, a Comissão Mundial para a Cultura e o Desenvolvimento, da ONU/Unesco, e a Comissão Internacional de Bioética.
Celso Furtado faz parte dos pensadores brasileiros que interpretam o subdesenvolvimento como uma forma de organização social no interior do sistema capitalista, sendo contrário à ideia de que seja uma etapa para o desenvolvimento econômico, como podem sugerir os termos de país "emergente" e "em desenvolvimento".
O subdesenvolvimento é um processo estrutural específico, “uma configuração que se reproduz em distintos níveis do crescimento”[3] e não uma fase pela qual tenham passado os países hoje considerados desenvolvidos.
Os países subdesenvolvidos tiveram, segundo Furtado, um processo de industrialização indireto, ou seja, como consequência do desenvolvimento dos países industrializados. Este processo histórico específico do Brasil criou uma industrialização dependente dos países já desenvolvidos e, portanto, não poderia jamais ser superado sem uma forte intervenção estatal que redirecionasse o excedente, até então usado para o "consumo conspícuo" das classes altas, para o setor produtivo. Note-se que isto não significava uma transformação do sistema produtivo por completo, mas um redirecionamento da política econômica e social do país que levasse em conta o verdadeiro desenvolvimento social.[10]
História do Brasil
No intuito de explicar as causas do subdesenvolvimento brasileiro, Celso Furtado analisou a história do país considerando o modelo centro-periferia, muito comum no pensamento econômico da CEPAL. Furtado defendia que o Brasil era periferia em relação ao centro, composto por países europeus e pelos Estados Unidos, até o fim do ciclo do café. Por consequência, o dinamismo do país era desproporcionalmente dependente das condições econômicas do centro.
Além desse desequilíbrio, o Brasil possuía uma lógica social e econômica própria na qual uma economia de subsistência - com muito baixa produtividade - existia ao lado de uma economia altamente dinâmica voltada à exportação. A relação entre as duas caracterizou os diferentes ciclos do país: ciclo da cana-de-açúcar, ciclo do ouro e ciclo do café. Esse último permitiu o início de um forte processo de industrialização no país. No entanto, por conta de sua posição de periferia e o desequilíbrio entre suas duas "economias" internas, o Brasil teve que constantemente enfrentar dois grandes problemas: inflação e desigualdade de renda.[11]
Para Furtado, o Governo Vargas, que assumira o país a partir de 1930, fora fundamental para industrializar o Brasil. O programa econômico varguista decidira comprar o excesso de café produzido, com o intuito de controlar os preços internacionais do produto; a partir desse crédito, e da desvalorização cambial, inicia-se a instalação de indústrias, sob o processo de Substituição de importações.[12]
Foi eleito em 7 de agosto de 1997, sucedendo Darcy Ribeiro como o oitavo ocupante da cadeira 11, que tem por patrono Fagundes Varela. Tomou posse em 31 de outubro, recebido pelo acadêmico Eduardo Portella.
Em seu discurso de posse, registrou:
"O fundador desta Cadeira número 11 foi um antepassado meu, Lúcio Furtado de Mendonça, de quem possivelmente herdei os pendores memorialísticos, o gosto malsucedido pela ficção literária e uma irreprimível sensibilidade social. Esse socialista declarado empenhou-se na criação desta Academia e certamente a ele mais do que a ninguém devemos a existência desta nobre Instituição."
Pensamento e obras
Dentre suas obras são listadas:
Contos da vida expedicionária – de Nápoles a Paris. RJ, Zelio Valverde, 1946
A economia brasileira. RJ, A Noite, 1954
Uma economia dependente. RJ, Ministério da Educação e Cultura, 1956
Perspectivas da economia brasileira. RJ, Instituto Superior de Estudos Brasileiros, 1958
Formação econômica do Brasil. 14ª ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1976.
Formação econômica do Brasil. 24ª ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1991.
Formação econômica do Brasil. 34ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
Formação econômica do Brasil. Edição comemorativa do cinquentário. Org: Rosa Freire d'Aguiar Furtado; apres.: Luiz Felipe de Alencastro. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
A Operação Nordeste. RJ, Instituto Superior de Estudos Brasileiros, 1959
Uma política de desenvolvimento econômico para o Nordeste. RJ, Imprensa Nacional, 1959
Desenvolvimento e subdesenvolvimento. RJ, Fundo de Cultura, 1961
Subdesenvolvimento e Estado democrático. Recife, Condepe, 1962
A pré-revolução brasileira. RJ, Fundo de Cultura, 1962
Dialética do desenvolvimento. RJ, Fundo de Cultura, 1964
Subdesenvolvimento e estagnação na América Latina. RJ, Civilização Brasileira, 1966.
Teoria e política do desenvolvimento econômico. SP, Editora Nacional, 1967
Um projeto para o Brasil. RJ, Saga, 1968
Formação econômica da América Latina. RJ, Lia Editora, 1969
Outras edições:
A economia latino-americana. SP, Companhia Editora Nacional, 1976
A economia latino-americana. SP, Companhia das Letras, 2007
A economia latino-americana - edição comemorativa dos 50 anos. SP, Companhia das Letras, 2019.
Análise do "modelo" brasileiro. RJ, Civilização Brasileira, 1972
A hegemonia dos Estados Unidos e o subdesenvolvimento da América Latina. RJ, Civilização Brasileira, 1973
O mito do desenvolvimento econômico. RJ, Paz e Terra, 1974 (Versão em inglês: The Myth of Economic Development. Tradutor: Jordan B. Jones, Polity Press, 2020)
Criatividade e dependência na civilização industrial. RJ, Paz e Terra, 1978
Outras edições:
Criatividade e dependência na civilização industrial. 3ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. Prefácio de Alfredo Bosi.
O Brasil pós-"milagre". RJ, Paz e Terra, 1981
A nova dependência, dívida externa e monetarismo. RJ, Paz e Terra, 1982
Não à recessão e ao desemprego. RJ, Paz e Terra, 1983
Cultura e desenvolvimento em época de crise. RJ, Paz e Terra, 1984
A fantasia organizada. RJ, Paz e Terra, 1985
A fantasia desfeita. SP, Paz e Terra, 1989
Transformação e crise na economia mundial. SP, Paz e Terra, 1987
ABC da dívida externa. SP, Paz e Terra, 1989
Os ares do mundo. SP, Paz e Terra, 1991
Brasil, a construção interrompida. SP, Paz e Terra, 1992
O capitalismo global. SP, Paz e Terra, 1997
Obra autobiográfica, 3 vol.. SP, Paz e Terra, 1997. Nova edição: SP, Companhia das Letras. 2014.
O longo amanhecer. SP, Paz e Terra, 1999
Economia Colonial no Brasil nos séculos XVI e XVII [1948] SP, Hucitec/Abphe, 2001.
Raízes do subdesenvolvimento. RJ, Civilização Brasileira, 2001
Em busca de novo modelo. SP, Paz e Terra, 2002
Essencial Celso Furtado (antologia). SP, Penguin Classics/Companhia das Letras, 2013.
Obra autobiográfica. (A fantasia organizada; A fantasia desfeita; Os ares do mundo). Coord.: Rosa Freire d'Aguiar. SP, Definitiva/Companhia das Letras, 2014.
Diários Intermitentes de Celso Furtado.1937-2002. Org.: Rosa Freire d'Aguiar. SP, Companhia das Letras, 2019.
Correspondência Intelectual de Celso Furtado. 1949-2004. Org.: Rosa Freire d'Aguiar. SP, Companhia das Letras, 2021.
↑GRUPO MISTO DO BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DO BRASIL E DA COMISSÃO ECONÔMICA PARA AMÉRICA LATINA (1957). Análise e projeções do desenvolvimento econômico. Rio de Janeiro: Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico. pp. 290p.
↑Bielschowsky, Ricardo (1989) "Formação econômica do Brasil: uma obra-prima do estruturalismo cepalino", Revista de Economia Política, Outubro-Dezembro, Vol. 9, Número 4, páginas 38-55
↑FONSECA, Pedro Cézar Dutra. A Revolução de 1930 e a Economia Brasileira. In: 844 EconomiA, Brasília(DF), v.13, n.3b, p.843–866, set/dez 2012
Ligações externas
Outros projetos Wikimedia também contêm material sobre este tema:
Para onde caminhamos? O último artigo escrito por Celso Furtado, no qual o economista aborda a urgência de uma reforma fiscal no Brasil e as altas taxas de juros que sufocam a economia do país (publicado no Jornal do Brasil de 14 de novembro de 2004).